Chapada Diamantina: Travessia do Parque (Parte 2) - Cachoeirão

Da Igrejinha ao pernoite isolado nos gerais 


O dia amanheceu chuvoso como na maior parte dos dias. Sempre começava a chover de madrugada e por volta das 8h o tempo abria. Fiquei na barraca esperando a chuva parar, quando ela parou, saí para desmontá-la e, como um trote da natureza, começou a chover quando eu estava no meio da desmontagem, molhando tudo. Minutos depois que eu terminei, o tempo abriu e fez sol, valeu natureza!

Acampamento na Igrejinha


Parti para a minha jornada às 9h da manhã e meu objetivo era chegar no Cachoeirão por cima, uma das vistas mais sensacionais da Chapada Diamantina, e depois seguir para pernoitar na Lapa do Caboclo, uma gruta com pinturas rupestres e que, segundo o guia que eu conversei, era possível chegar naquele mesmo dia para pernoitar.

Ao pegar a trilha de saída da Igrejinha, escorreguei no barro molhado e caí na lama. Bom começo


Mesmo amanhecendo com chuva, o sol foi aparecendo entre as nuvens


A trilha vai subindo e vão aparecendo algumas bifurcações, mas não tem como se perder, é só ir seguindo o caminho que sobe, geralmente o da esquerda. Quando começa a ficar alto já proporciona umas vistas bonitas para fotos do Pati do Alto.

A trilha vai subindo em direção sul até voltar para o alto da serra, na mesma trilha que vem de Bomba


Outro excelente ângulo de Pati do Alto


DE VOLTA AOS GERAIS

Quando a trilha encontra a trilha dos gerais que eu havia seguido no dia anterior no trajeto desde o Vale do Capão, o mesmo desconforto continua pois em vários trechos o solo fica alagado. Como eu já disse, suponho que isso se deve ao solo rochoso por baixo da terra que absorve pouca água.

Uma boa bota impermeável é uma opção para não ficar com o pé molhado, a outra opção é ficar em casa (!) 


Em cima a vegetação é bem diferente da mata atlântica próxima à Igrejinha


Quando as trilhas se encontram o terreno fica mais plano


NA TRILHA DO CACHOEIRÃO

Da Igrejinha para o Cachoeirão se percorre aproximadamente 6 Km. A maioria dos visitantes usa o acampamento da Igrejinha como base e faz essa trilha (ida/volta) com mochila de assalto. Como a trilha é caminho para Mucugê, tive que fazê-la com o mochilão para não voltar tudo de novo. Como eu estava com o trajeto salvo no GPS, fiquei atento no ponto de entrada. Existe uma pedra que marca o ponto que a trilha dos gerais bifurca. O caminho para o Cachoeirão é a trilha da esquerda.

Pedra que marca a bifurcação para a trilha do Cachoeirão, o caminho é o da esquerda


Dali ainda teria quase 2 km pela frente, então, seguindo o conselho dos guias que eu conversei na Ruinha, fui até a Toca da Águia, um abrigo de rochas que fica no caminho para o Cachoeirão, bem no ponto que a trilha cruza um córrego pela primeira vez. A toca é um lugar usado para acampamento e, como referência, escondi minha mochila cargueira na mata para andar mais leve até meu objetivo.

"Entoquei" a mochila perto de uma referência, mas também marquei o ponto no GPS para não perder


A Toca da Águia


Vestígios de que alguém usou recentemente a toca como lugar de acampamento


Continuei a trilha mais leve, só com minha bolsa, conseguindo assim caminhar com mais agilidade. A trilha que segue até o Cachoeirão é bem tranquila, bem plana, e com uma paisagem muito bonita. Além de se aproximar das montanhas de pedra com formatos bem estranhos, o caminho também dá um show com sua vegetação repleta de bromélias e de flores violetas.

Campos inteiros de pequenas flores que nascem entre as pedras


Os paredões de pedra como obras de arte


O piso também é esculpido pela natureza


Foi então que a paz foi quebrada por um barulho conhecido, era o grupo que eu conheci no caminho para a Igrejinha que se aproximava para chegar no Cachoeirão também. Como todos fazem, vieram fazer um "bate e volta" a partir do acampamento da Igrejinha. Apesar de eu já ter me despedido pela manhã, nos reencontramos, mas como sempre, eu não segui com eles, mantive o meu ritmo para ver cada detalhe. Não tenho nada contra os guias, mas esses passeios guiados acabam te obrigando a seguir o ritmo de outra pessoa ou do grupo.

Bromélias + flores + pedras + um doido


A folha dessa planta aí parece de plástico


A mata começa a fechar e então aparece uma cachoeirinha que forma uma piscina natural. Com o calor que já fazia naquele horário de 11h da manhã, até que cair ali não era mau negócio, porém eu adiei para a volta, afinal, a missão ainda não estava cumprida. A trilha continua atravessando a cachoeirinha.

Cachoeira com piscina natural no caminho


O CACHOEIRÃO POR CIMA

Enfim a chegada ao Cachoeirão cuja a vista do cânion é o mais impressionante. Assim como na Cachoeira da Fumaça, as lajes de pedra se projetam sobre o abismo criando mirantes vertiginosos. A combinação de sol e das gotículas d´água da cachoeira que são empurradas de volta pelo vento formou um arco-iris para melhorar ainda mais a paisagem.

O fabuloso cânion do Cachoeirão


A vista da cachoeira a partir do primeiro mirante


A água já desintegrada pelos ventos no final da cachoeira 


O arco-iris apareceu para o show de imagens


Depois do primeiro mirante existe um outro, seguindo pela direita. Deste outro ponto também se tem uma vista privilegiada do cânion e ainda uma surpresa, outra cachoeira. Na mesma montanha do primeiro mirante existe um segundo "cachoeirão" que não dava para ver daquele ângulo.

Vista do outro mirante


O segundo cachoeirão


Até eu que não tenho medo de altura fiquei "bolado" com a vista vertiginosa do Cachoeirão


Enfim, missão cumprida e um banho refrescante na cachoeirinha e um mergulho na piscina natural. aproveitei para lavar minha roupa que estava enlameada desde que eu escorreguei na trilha quando saí da Igrejinha. Então, mais uma vez encontrei com meus amigos de trilha. Após algumas conversas e troca de comidas, minha roupa secou e eu segui meu caminho dessa vez com uma despedida de verdade.

Momentos de energização nas águas, melhor carregadora de baterias


Mais uma obra de arte em pedras feita pela natureza da Chapada


SEGUINDO DESTINO PARA MUCUGÊ

A partir de agora a porra ficou séria! Meu destino era seguir na direção sul do Parque Nacional da Chapada Diamantina. O problema é que a grande maioria das travessias é feita em direção a Andaraí, cruzando o Vale do Pati. Lá existe uma estrutura melhor de apoio devido às casa dos nativos da região. O lugar onde eu iria me aventurar não tinha nada de civilização pelo menos nos próximos 20 Km. Como não há nada e poucos seguem a trilha em direção a Mucugê, a possibilidade da trilha estar pouco visível também é grande.




Lógico que eu estava preparado para esta aventura com tudo em minha mochila que fosse necessário para sobreviver caso algo desse errado. Na conversa com o guia antes de sair do Cachoeirão, ele afirmou que a trilha até a Lapa do Caboclo, meu objetivo para o pernoite, dava um pouco mais de 2h. Eu não tinha o trajeto da trilha que eu iria tentar, apenas alguns pontos do percurso no GPS, e um deles era a Lapa do Caboclo que marcava mais de 15 Km de distância. Não sabia o que era, mas algo estava errado pois seria impossível chegar mochilado numa distância dessas em 2h de terreno irregular.

Com apenas alguns pontos marcados no GPS, segui a trilha para a área desabitada da Chapada Diamantina


Saindo Cachoeirão eu só veria sinal de civilização em Mucugê, depois de mais de 20 Km


SHOW DAS ÁGUAS

A trilha segue paralela ao Rio Preto, cruzando com vários afluentes dele, isso a deixa quase toda meio alagada, mas permite o acesso a água potável o tempo todo. Além de ser um refresco para a garganta, também refresca os olhos com belas imagens.

Trilhas alagadas mas com água limpa


Vários afluentes do Rio Preto cruzam pela trilha vindos das partes altas


A cor da água é assim supostamente pela quantidade de ferro. Como eu não sou químico e não li nenhum estudo que confirmasse isso, eu usei alguns comprimidos de purificação antes de beber essa água. Próximo a um desses córregos parei para jantar

Não, não é meu xixi, é água potável da Chapada


Como o lugar é totalmente isolado da civilização, tenho certeza de que a cor não é escura por causa de esgoto


O efeito das águas escuras é bem marcante


QUANDO O PERRENGUE SE APROXIMA

Eu já seguia a trilha por 3 horas e nada de chegar à tal Lapa do Caboclo. O GPS informava que eu apenas passei pelo Morro do Meio ou seja, ainda faltava mais 10 Km. Foi assim que eu descobri que o GPS estava certo, a informação do guia estava furada (afinal, não deve ter muito passeio guiado por aquela terra de ninguém onde eu me encontrava). Sendo assim, eu teria que achar um local para montar minha barraca antes que escurecesse.

O sol começava a baixar e eu não tinha idéia de onde acampar


Eu me encontrava um imenso campo sem saber onde acampar. Ao olhar para a esquerda via o sol descendo para em breve sumir por trás das montanhas e ao olhar para a frente somente os gerais quase sempre alagados. Mesmo que eu achasse um trecho seco para montar a minha barraca, uma chuva na madrugada poderia causar uma enchente e seria um inferno. Observei que a trilha parecia que se aproximava das montanhas então acelerei o passo para chegar logo naquelas terras mais altas antes do pôr-do-sol. 

O sol se põe e com ele a luz


Foi então que o sol se pôs e naquela correria toda para achar um lugar seguro antes que a luz desaparecesse, eu saí da trilha e segui em linha reta para as terras mais altas. Como eu ainda estava longe da montanha, escolhi uma laje de pedra no chão pois era a certeza de ser um nível alto do terreno. Montei a barraca perto dos raros arbustos que existiam por ali, isso para proteger de alguma possível rajada de ventos, afinal eu estava no alto da serra e não sabia como seria a força dos ventos da madrugada. 

Com o sol se pondo, eu montei rapidamente a barraca para encarar o pernoite isolado


Terminada a montagem da barraca, entrei nela e eu só sairia quando amanhecesse. A única certeza que eu tinha é que não haveria nenhum perigo humano pelo menos num raio de 10 Km. Aquela noite era só eu e a Chapada Diamantina. Somente no dia seguinte eu perceberia que o fato de eu ter saído da trilha contribuiria para o perrengue que estava por vir.





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Sobre o autor

Sobre o autor
Renan é carioca, mochileiro, historiador e arqueólogo. Gosta de viajar, fazer trilhas, academia, ler sobre a história do mundo e os mistérios da arqueologia, sempre comparando os lados opostos de cada teoria. Cada viagem que faz é fruto de muito planejamento e busca conhecer o máximo de lugares possíveis no curto período que tem disponível. Acredita que a história foi e continua sendo distorcida para beneficiar alguns grupos, e somente explorando a verdade oculta no passado é que se consegue montar o quebra-cabeça do mundo.